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Fiscalização por videomonitoramento

A fiscalização de trânsito realizada por meio de monitoramento em vídeo foi implementada no Brasil desde 2014. Mas até hoje encontramos desconformidades com os preceitos legais.

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Fundamentação legal

A fiscalização por VIDEOMONITORAMENTO é prevista no CTB (Código de Trânsito Brasileiro), que estabelece:

CTB, art. 280 […]

§ 2º A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN.

Perceba que o legislador atribuiu ao Conselho Nacional de Trânsito a competência para regulamentar o tema. O CONTRAN por sua vez, publicou a Resolução nº 471/2014, que regulamenta a utilização de sistemas de videomonitoramento para fiscalização de trânsito em estradas e rodovias.

De acordo com a referida norma, a Autoridade ou o Agente da Autoridade de Trânsito, exercendo a fiscalização remota por meio de sistemas de videomonitoramento, poderão autuar condutores e veículos, cujas infrações por descumprimento das normas gerais de circulação e conduta tenham sido detectadas “online” por esses sistemas.

Devendo ainda, informar no campo de “observações” do auto de infração a forma com que foi constatado o cometimento da irregularidade.

Importante destacar que, INICIALMENTE, esse tipo de fiscalização só poderia ser realizado em RODOVIAS e ESTRADAS (vias rurais).

Porém, o CONTRAN publicou posteriormente a Resolução nº 532/2015 para incluir a fiscalização por câmeras de monitoramento também nas vias urbanas.

Contestação em vias Judiciais

Inclusive, a fiscalização por videomonitoramento foi objeto de questionamento judicial por meio de Ação Civil Pública. Em 2019, o TRF-5 decidiu da seguinte forma o Processo nº 0806871-88.2017.4.05.8100:

Face ao exposto JULGO PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO para que seja excluído do sistema de verificação de infrações de trânsito por videomonitoramento as supostas infrações cometidas dentro dos veículos, por violar o princípio constitucional do direito à intimidade e privacidade.

Também NÃO PODERÃO ser apuradas por videomonitoramento as infrações que tenham sistema próprio de apuração, como avanço de sinal, excesso de velocidade ou de carga etc. Bem como as infrações pela não utilização do farol baixo durante o dia, previsto na lei 13.290/2016, NÃO PODERÃO ser aferidas por videomonitoramento, nas zonas urbanas, mesmo de trechos de rodovias federais ou estaduais, que estejam em tais áreas, com exceção em túneis, mesmo iluminados.

Todas as infrações por videomonitoramento não ressalvadas nesta decisão, SÓ PODERÃO ser aplicadas com a descrição completa e detalhada da infração, para que o infrator saiba efetivamente o que infringiu, quando e onde, para que possa se defender, se assim desejar, sob pena de nulidade.

Necessidade de aviso por meio de Sinalização

Independentemente das restrições judiciais impostas, é importante frisar que a fiscalização de trânsito mediante sistema de videomonitoramento somente poderá ser realizada nas vias que estejam devidamente sinalizadas para esse fim.

Portanto, não é em qualquer local que a fiscalização por meio de videomonitoramento pode ser realizada, pois a NORMA EXIGE que o trecho da via esteja devidamente sinalizado. Sendo assim, o questionamento a ser feito é o seguinte: Qual o TIPO de sinalização a ser utilizada nesse caso?

Manuais Técnicos de Sinalização de Trânsito

Por fazer menção à existência de sinalização no local, faz-se necessário observar as disposições normativas acerca da sinalização de trânsito.

Nos manuais de sinalização que estão regulamentados nas Resoluções nº 180/2005, 236/2007, 243/2007, 483/2014, 486/2014 e 690/2017, todas do CONTRAN, dentre os princípios aplicáveis, estão o da legalidade e o da padronização.

Sempre observando o Código de Trânsito Brasileiro e a legislação complementar e os sinais devem seguir um padrão legalmente estabelecido, de modo que situações iguais devem ser sinalizadas com o mesmo critério.

Falta de sinalização

A crítica se dá pelo fato de NÃO EXISTIR SINALIZAÇÃO ESPECÍFICA e padronizada, fato este que torna a fiscalização questionável.

Imagine que a cidade de São Paulo definiu sua própria sinalização para esses trechos, o Rio de Janeiro definiu outra, Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife, Caruaru, Belém, Maceió, João Pessoa, São Luiz, cada uma com modelo de sinalização diferente, como identificar de forma inequívoca que o trecho é fiscalizado por câmeras?

Admitir a utilização de sinalização SEM observância dos princípios da LEGALIDADE e da PADRONIZAÇÃO, para que sejam implantadas nas vias com fiscalização por videomonitoramento, se equivaleria a permitir uma placa de parada obrigatória (R-1) com formato circular ou oval, de cor verde, amarela ou azul, produzindo efeitos (autuação) e sem questionar sua legalidade.

Sinalização inventada

Desde que se iniciou esse tipo de fiscalização, o que se tem visto é a utilização de placas muitas vezes criadas pelo próprio órgão, como por exemplo, o formato de uma placa de advertência ou de regulamentação com o desenho de uma câmera, que evidentemente NÃO EXISTE na legislação de trânsito.

O § 2º do art. 80 do Código de Trânsito Brasileiro estabelece que o CONTRAN poderá autorizar, em caráter experimental e por período prefixado, a utilização de sinalização não prevista no CTB, mas é necessário autorização.

O tipo de sinalização mais utilizado pelos órgãos têm sido as PLACAS EDUCATIVAS com o aviso de que o trecho é fiscalizado por meio de videomonitoramento.

Inclusive, há quem defenda essa possibilidade, refutando qualquer vício de legalidade, o que respeitosamente DISCORDAMOS pelo seguinte:

O Anexo II do CTB (Resolução nº 160/2004 do CONTRAN) e o Volume III – Sinalização Vertical de Indicação, do Manual Brasileiro de Sinalização de Trânsito (Resolução nº 486/2014) estabelecem que as placas educativas tem a função de EDUCAR os usuários da via quanto ao seu comportamento adequado e seguro no trânsito – podem conter mensagens que reforcem normas gerais de circulação e conduta. Mas esta FINALIDADE não parece se encaixar no contexto da fiscalização por videomonitoramento.

Cumprir e fazer cumprir a lei

Além dos princípios aplicáveis à sinalização que aqui foram expostos, os órgãos de trânsito devem cumprir a lei antes mesmo de fazer cumpri-la, como se depreende da leitura do Capítulo II do CTB que trata das atribuições dos órgãos que compõem o Sistema Nacional de Trânsito. Portanto, os órgãos estão sujeitos ao princípio da estrita legalidade.

Acerca do tema, convém citar o professor Julyver Modesto de Araujo (Lições de Direito Administrativo para os profissionais de trânsito, 2018, p. 71-72):

Legalidade estrita significa, destarte, a obrigatoriedade da Administração pública em fazer APENAS o que está EXPRESSAMENTE previsto na Lei. Infelizmente, entre aqueles que não conhecem tal princípio, é comum alguns se manifestarem como CIDADÃO e não como AGENTE PÚBLICO, todavia, há uma diferença substancial: se algo não está escrito na lei, para o particular quer dizer que está LIBERADO, mas, para a Administração, que está PROIBIDO”.

Conclusão

Todo meio tecnológico que possa auxiliar na fiscalização é bem-vindo, pois onde há presença da fiscalização se consegue coibir a prática de irregularidades no trânsito e consequentemente diminuir o número de acidentes – já que uma parcela considerável de condutores respeita as normas somente quando sabe que está sendo fiscalizado.

Mesmo sendo positiva a implantação desse sistema de fiscalização, NÃO PODEMOS IGNORAR as disposições legais que norteiam o tema.

Apesar desse ponto controverso envolvendo a sinalização ser questionável por parte dos condutores eventualmente autuados, não há garantia de que uma defesa seja acolhida pelo órgão fiscalizador quando forem suscitados aspectos como esses nos argumentos de defesa, o que não afasta a possibilidade daquele que se sentir prejudicado possa buscar a via judicial (art. 5º, XXXV, da CF/88).

Para pôr fim a qualquer tipo de discussão nesse sentido, o CONTRAN poderia ter indicado, nas duas resoluções que tratam da fiscalização por videomonitoramento, qual tipo de sinalização a ser utilizada ou publicar norma padronizando a sinalização a ser implantada nesses locais, findando os questionamentos sobre o tema.

Caruaru-PE / Rio de Janeiro-RJ, 24 de julho de 2020.

Coautoria: LEANDRO MACEDO – Policial Rodoviário Federal no Rio de Janeiro. Atuou no TCM-RJ na função de Auditor Público como técnico de controle externo (2012). Coordenador do site Concursos com Trânsito e idealizador da empresa LM Cursos de Trânsito. Coautor do livro “Curso de Legislação de Trânsito”.

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